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sábado, 21 de junho de 2014

O quê que a Costa Rica tem



Assisti aos dois jogos da Costa Rica, o primeiro contra o Uruguai, pela TV, o segundo contra a Itália, na Arena Pernambuco. Um jogo cujos ingressos só consegui comprar, creio, porque ninguém acreditava na Costa Rica, e acabou se tornando um jogo histórico.

Sim, ninguém dava nada pela Costa Rica, ainda mais no “grupo da morte”, reunindo Uruguai, Itália e Inglaterra. E o pequeno país da América Central, ao derrubar dois gigantes do futebol mundial em suas duas primeiras partidas, classificando-se na frente de todos e eliminando matematicamente a Inglaterra, realizou não apenas uma das maiores façanhas desta como de todas as Copas.

Na primeira partida, minha impressão é de que a Costa Rica havia tido muita sorte. A bola caíra no lugar certo na hora certa, como às vezes acontece no futebol. O Brasil já perdeu assim, em 1.982, diante da Itália. Um time mais poderoso, jogando bem, toma um gol de surpresa, quase por acaso, e de repente parece que tudo começa a dar certo para o adversário. Sem muito tempo de recuperação, quando se vê, Golias foi derrubado por Davi.

Na segunda partida, contra a Itália, estando na arquibancada, tive uma segunda impressão. A Costa Rica pode estar tendo sorte, mas também sabe mesmo jogar.

Não que seja algo de excepcional. Eles apenas fazem bem o que já conhecemos. Jogam em duas linhas de quatro, como muitos times brasileiros, e procuram compactar os jogadores, mantendo uma linha próxima da outra. Esse bloco fica mais adiante, quando querem pressionar o adversário, ou mais atrás, quando estão na frente do marcador e buscam jogar em contra-ataque.

No primeiro tempo, a Costa Rica corajosamente postou seus dois blocos mais adiante, para pressionar a Itália. Quando perceberam o espaço que os defensores costa-riquenhos deixavam às suas costas, usando como tática a linha de impedimento, os italianos quase abriram o placar por duas vezes em lançamentos de profundidade. Em um deles, uma precisa bola de Pirlo, o centroavante Balotelli desperdiçou um gol feito ao tentar encobrir o goleiro. Os costa-riquenhos tiveram também um pouco de sorte e ajuda do bandeirinha, que por algumas vezes marcou impedimento em lances legais do ataque italiano.

A Itália jogou bem o primeiro tempo, e poderia ter saído na frente, mas não conseguiu marcar o gol. A Costa Rica não perdeu a chance que teve, uma cabeçada certeira aos 43 minutos, que fez o time italiano, sem tempo de qualquer reação, sair de cabeça quente para o vestiário.

Na segunda etapa, já em vantagem, a Costa Rica recuou suas duas linhas de quatro mais para perto da própria área, fechando os espaços para os italianos, e jogando em contra-ataque. Fez bem ambas as coisas. Não marcou mais nenhum gol, mas anulou a Itália, que cansou com o calor pernambucano, entregando-se no final.

A Costa Rica mostrou ser uma equipe versátil, que sabe jogar tanto no ataque quanto na defesa. Possui jogadores habilidosos, como o centroavante Campbell, heroi do jogo contra o Uruguai, que nesta segunda partida teve participação mais discreta; e o meio-campista, autor do gol da vitória, que é o maior craque do time: Bryan Ruiz, jogador do PSV, da Holanda.

Contra a Itália, sem dúvida a Costa Rica não venceu por sorte, ou conjunção astral: venceu jogando, de igual para igual. Centrando seu jogo em Pirlo, um armador brilhante e clássico, mas meio lento, os italianos viram um adversário que usou a seu favor a velocidade. Ser rápido nos passes, no deslocamento e na virada de jogo é essencial no futebol moderno.

Além de velozes e bem entrosados, os jogadores costa-riquenhos são habilidosos e até um pouco abusados. Tentaram dar chapéu e dribles de efeito humilhantes nos honoráveis integrantes da velha Squadra Azurra. Talvez tenha contado para isso a preparação na Vila Belmiro, onde os costa-riquenhos foram beber da água que fez de Santos a meca do futebol-arte e da irreverência futebolística, na qual se formaram, entre tantos outros, Pelé e Neymar.

O técnico costa-riquenho, Jorge Luis Pinto, um colombiano que nos anos 1.970 estudou no Brasil e torce para o Corinthians, no final do jogo mostrou ter não apenas ousadia como elenco. Deu-se ao luxo de substituir seus dois melhores jogadores, Bryan Ruiz e Campbell. Enquanto isso, a Itália colocou em campo dois suplentes que não apenas nada acrescentaram ao ataque italiano como participaram de alguns lances bizarros, mostrando-se psicologicamente perdidos. Um deles, Insigne, segundo um amigo é apelidado na Itália de Scugnizzo, como se chamam os moleques de rua em Napoli. Ontem, porém, o espírito do moleque de rua, o alegre peladeiro, estava do lado da Costa Rica.

Surpresa para quem nunca tinha visto, os costa-riquenhos têm uma torcida grande e fanática por futebol. Lotaram parte do anel inferior da Arena Pernambuco como uma torcida organizada à moda brasileiro, e ocupavam esparsamente pelo menos um terço das arquibancadas. Outro terço era formado por italianos, numerosos mas espalhados, e o terço restante eram sobretudo brasileiros e mexicanos, além de torcedores de outras nacionalidades.

Ao final, a festa: os jogadores bailaram em campo na ponta dos pés, comemorando a travessa classificação em meio aos gigantes do futebol. No túnel de saída do estádio, os torcedores costa-riquenhos cantavam, felizes e provocadores:

“Donde están, donde están,
Los italianos que nos ivan a ganar?”

A Costa Rica não é a aparição de nenhuma nova ordem no futebol mundial. Porém, mostra que um time habilidoso, unido e bem preparado pode ir longe, mesmo sem tradição. Grandes momentos do futebol são feitos assim. A Costa Rica agora não é mais surpresa e vai ter vida dura pela frente. Porém, jogando um futebol à brasileira, até agora conseguiu ser melhor que o próprio Brasil, no futebol e nos resultados. Dá prazer vê-los jogar. E isso só valoriza o grande espetáculo de bom futebol que tem sido essa Copa.

Como é um dia na Copa

Levantamos às 4:20 da manhã, eu e meu filho, de 7 anos, para o nosso primeiro dia numa Copa do Mundo - dele e meu, que tenho 50. Objetivo, sair de São paulo num voo às 6:40, para assistir, em Recife, o jogo da Itália contra Costa Rica, cujos bilhetes eu comprara depois de muito suar diante do computador no site da Fifa, um mês antes, quando ninguém achava que a Costa Rica seria a sensação da Copa. Como descendente de italianos, eu, como muita gente, tenho a Itália em segundo lugar no coração, depois do Brasil - e venho tentando passar esse sentimento de italianidade para o pequeno André.

Saímos sonolentos, mas animados, e o voo transcorreu sem incidentes. No aeroporto de Recife, recebemos a notícia de que o transporte para o estádio era apenas de "metrô". Eu, que imaginara ir de táxi, entrei na fila do bilhete, na verdade uma pulseirinha vermelha que dava acesso aos trens e depois ao ônibus que completaria a viagem.

Dez minutos de caminhada na passarela que conduz do aeroporto à estação. O metrô, na verdade, não é um metrô, e sim um trem de superfície que vem de Jaboatão e segue até Recife, de onde se toma outra linha até a estação Cosme Damião, onde os organizadores prepararam os ônibus de ligação para a Arena Pernambuco. O estado do trem é razoável, melhor que os trens de subúrbio em São Paulo, e pior que os metrô paulistano. Tinha até ar condicionado, cujo efeito logo desapareceu assim que os vagões ficaram superlotados pelos passageiros locais, somados aos torcedores que enchiam o aeroporto e lotaram também o coletivo.

O trajeto de trem foi meio penoso: o trem, no sistema pinga-pinga, para não prejudicar o transporte da população local, levou cerca de 40 minutos com duas dezenas de paradas até Cosme e Damião. Mas o ambiente de alegria, com tanta gente misturada, se aliava ao bom espírito do dia para manter o moral elevado, sem a costumeira reclamação dos brasileiros que agora se queixam de qualquer incômodo. No trem, já tinha uma amostra do que encontraríamos no estádio: uma mistura de gente fantasiada, torcedores das mais diferentes seleções, italianos da Itália e outros do Brasil, seus descendentes, muitos torcedores do Palmeiras, o clube mais italiano entre os brasileiros. E a torcida costa-riquenha, em grande número, tão surpreendente quanto sua seleção.

Fomos em pé até Cosme Damião e, também em pé, num dos ônibus tirados das linhas comuns para fazer o transporte até o estádio. Saíam um após o outro em fila indiana até o estádio, num trajeto de cerca de mais 10 minutos.

A Arena Pernambuco foi construída no meio da zona da mata, fora da cidade. Chegar lá é mais ou menos como visitar um parque da Disney. O ônibus estaciona a cerca de um quilômetro do estádio, e essa parte do trajeto a multidão fez a pé. Antes da entrada, barraquinhas de comida e refrigerante dos recifenses eram o último contato com o Brasil. O estádio, que lembra uma espaçonave metálica descida no meio da mata, está longe de qualquer coisa, exceto de um condomínio de classe média alta que só se avista quando se sobe ao último estágio da arquibancada. pensei nos milhões dos estádios gastos com a Copa, e qual o futuro daquilo depois que a Copa acabar, mas, ora, ainda estávamos na Copa, e eu precisava deixar de ser jornalista por um instante para ser apenas torcedor de futebol.

Na revista, aonde passaram meu pequeno saco de viagem pelo raio-X, nos proibiram de levar para dentro qualquer tipo de comida ou bebida. Lá dentro, só comprando comida dos patrocinadores, o que significava tomar Coca-Cola ou água da Coca-Cola, Brahma e Budweiser. Não havia suco para crianças e nada para comer diferente de um hambúrguer do McDonald's e cachorro quente.

Eu tinha uma preocupação. Apesar dos meus esforços, comprar ingressos em setores diferentes do estádio. Minha esperança era de convencer o pessoal na entrada a entrar junto com meu filho e colocá-lo no meu colo. Mas não tive o menor problema. os bilhetes passavam na catraca juntos e, lá dentro, havia grande liberdade de movimentação.

O conceito da Arena é muito civilizado. estádio mais verticalizado que os nossos, permite ótima visão tanto de quem está no anel inferior quanto nos dois superiores. de qualquer ponto, pode-se ver bem o jogo. O fato de não haver alambrado entre a torcida e o campo pede dos torcedores um nível mais elevado de civilização, o que não sei se funcionará quando retornarem aos gramados os times do brasileirão e as torcidas organizadas. Na Copa, porém, todo mundo se comporta de forma exemplar.

Não precisei também colocar meu filho no colo. Com os 40 mil pagantes anunciados mais tarde pelos alto-falantes, havia claramente cerca de 20% dos assentos livres. Nos sentamos em dois disponíveis lado a lado e ninguém nos intimou a sair do lugar até o final.

Os italianos tinham uma torcida tão numerosa quanto a da Costa Rica, proém, estavam mais espalhados. Além de se encontrar por todo o estádio, os costa-riquenhos tinham um bloco organizado no setor mais próximo ao campo, barulhento e incansável, que animou o time do começo ao fim.

Em tudo, o estádio parecia um franchising bem americano, todo decorado com os motivos da Copa, a comida, os equipamentos brilhando de novos, do banheiro aos assentos de plástico. Um voluntário se ofereceu para colocar em meu filho uma pulseira de identificação, caso ele se perdesse de mim. Outros indicavam os assentos, como se estivéssemos no teatro. Cada um tinha seu lugar marcado, mas nada impedia que se pudesse mudar de um lugar para outro, até mesmo em outro setor, se houvesse lugares vagos. E não houve briga nenhuma.

Na saída, um congestionamento monstro de gente na fila para pegar o ônibus de volta levou cerca de 40 minutos, mas não baixou o moral da torcida, satisfeita e animada. Quando o ônibus passou pelo subúrbio, até chegar á estação do trem, o que se via era o Brasil de verdade lá fora, as famílias que faziam seu churrasquinho no quintal dos barracos e tiravam fotografias pelo celular dos ônibus que passavam com a torcida para fora da janela. Fizemos todo o trajeto do "metrô" na volta, dessa vez com meu filho sentado, ou melhor, deitado sobre um pernambucano bonachão, que não se incomodou quando caiu sobre seu ombro dormindo até babar.


Chegamos no aeroporto de Cumbica, em Guarulhos, às 11:20. Enquanto meu filho dormia no trajeto, fiquei pensando. O que achei, afinal? A Copa é um barato. Foi muito bom participar de perto, estar com meu filho no meio do bando de loucos de todas as nações, algo muito diferente de apenas assistir pela televisão. Certamente é algo de que ele vai se lembrar pelo resto d vida, provavelmente até quando eu não estiver mais aqui. E isso não tem preço.

Na Copa, pessoas realmente se divertem, fantasiadas ou não, como numa grande festa, em que o futebol é apenas um pretexto para uma grande confraternização. Todos querem conversar, trocam experiências e todo o resto. Como um amigo que encontramos a caminho do estádio e contou ter recebido de outro brasileiro, que o confundiu com um italiano, a proposta de trocar sua camisa da Itália por uma do Brasil.

Os pernambucanos, simpáticos já por natureza, se mostravam muito atenciosos e preocupados em fazer tudo para agradar os visitantes, da conversa no trem ao atendimento no estádio. E não pareciam nem um pouco incomodados de ver aquele famoso dinheiro gasto na Arena Pernambuco ter ido para o futebol, em vez dos hospitais ou escolas. Pelo contrário, estavam bastante orgulhosos de poder receber gente do Brasil e do mundo inteiro e interessados em saber se estávamos satisfeitos com o que tínhamos visto, como o pobre que coloca na mesa a melhor comida que tem em casa, orgulhoso de ter visitantes importantes. A conta, ou o que vai acontecer depois, não são tão importantes diante do nosso patrimônio de alegria e generosidade.

De certa forma, é isso o que o Brasil está fazendo: gastando mais do que pode para organizar uma festa melhor do que somos para que fiquem de nós com a melhor impressão. Mas é assim que se fazem todas as festas, ou não?









terça-feira, 17 de junho de 2014

O que vale é bola na rede



Eu acreditei que o Uruguai chegaria à final. Contra o Brasil. Reedição de 1.950. O Uruguai tem um belo time, guerreiro, técnico, experiente. Foi o melhor sul-americano no mundial de 2.010, com um quarto lugar.

O Uruguai estreou contra Costa Rica, jogo bem o primeiro tempo, saiu na frente, tudo indicava um resultado normal. Aí o jogo virou uma dessas jornadas mitológicas, com tudo dando certo para a Costa Rica. Final, Costa Rica, 3 a 1. O Uruguai não só perdeu, como perdeu bem. O Uruguai passou a ter que ganhar de Inglaterra e Itália para se classificar sem depender de ninguém. A Copa desafia os gigantes.

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A Costa Rica teve Campbell, jogador do Olimpiakus. Já tinha ouvido falar? Nem eu. Um moleque esperto e sem medo com a bola no pé, ele foi o astro na vitória contra o Uruguai. Vai ser difícil a Costa Rica repetir o feito contra Itália e Inglaterra, mas quem sabe? Pelo menos por um dia, Campbell foi um herói do futebol.

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A Holanda massacrou a Espanha loga na estreia, com um placar cruel de 5 a 1, conquistado com um belo jogo e contra-ataques mortais. Parece que na derrota para o Brasil na Copa das Confederações, a mágica espanhola desapareceu. Aquele jogo quebrou sua espinha dorsal. Os espanhóis se arrastam agora em campo, sujeitos a outras humilhações. Podem ainda se levantar. Porém, quando o moral acaba, e a insegurança se instala, é muito mais difícil.

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Portugal também levou uma biaba da Alemanha: 4 a 0. Cristiano Ronaldo, o craque da hora, com seu penteado novo, foi uma peça decorativa no pouco utilizado ataque português. Para ficar mais feio, o zagueiro Pepe resolveu dar uma de valentão e foi expulso. Coitada da torcida lusitana. Nesta Copa, Portugal parece mais a Portuguesa.

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Os alemães têm o time mais bem preparado, que vem amadurecendo desde a última Copa, quando fizeram uma bela campanha. É um esquadrão bem organizado, rápido no ataque e mortífero na conclusão. Eu diria que, pelo futebol, é o favorito. Mas o bom futebol não é tudo para se ganhar uma Copa.

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Itália e Inglaterra fizeram a melhor partida até agora, como dois combatentes de guarda baixa, esmurrando um ao outro, para ver quem cairia primeiro. Caiu a Inglaterra, que cansou no final e não conseguiu reagir ao segundo gol italiano. Foram dois gigantes e prometem mais emoção.

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A Copa já teve grandes jogos, surpresas e muitos gols. Sim o futebol bonito está de volta. Até seleções tradicionalmente trancadas como Itália e Inglaterra jogaram abertas.

As partidas da primeira rodada lembram o que é mais preciso para ganhar qualquer competição de futebol: efetividade. Jogando bem ou não, ganha quem não perdoa. Aproveita as oportunidades. Essa frieza objetiva e implacável é o que resolve as partidas, sobretudo numa competição com times tão equilibrados. Como dizia o velho ditado, o que vale é bola na rede.
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E hoje tem Brasil e México!

sábado, 26 de dezembro de 2009

A história por trás da história


No final do Século 19, a Europa vinha de um período de guerras e grande pobreza, especialmente a Itália. Antes um país dividido, recém-reunido em uma campanha militar liderada pelo rei da Lombardia e do Piemonte, Vitor Emanuel II, havia pouco emprego, sobretudo no campo. No final dos anos 1800, começou a migração de mutios italianos para os países do Novo Mundo, que ofereciam oportunidades distantes, como os Estados Unidos e o Brasil.


Entre 1880 e 1930, vieram para o Brasil cerca de 1,4 milhão de italianos, de acordo com um levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE. Trazidos por navios a vapor, desembarcaram principalmente no Rio Grande do Sul, onde foram trabalhar como artesãos ou camponeses na serra gaúcha, e em São Paulo. No interior paulista, que precisava de mão de obra com o fim do trabalho escravo, eles eram contratados como colonos, trabalhadores assalariados.


Além de seus rendimentos, aos colonos era permitido também plantar para seu próprio sustento entre os pés de café nas terras do patrão. Com isso, os imigrantes italianos, bem como os portugueses e espanhóis, tinham uma renda adicional. Eles moravam em “colônias”, conjuntos de casas construídas especialmente para abrigá-los, e que acabavam por aproximar as famílias, incluindo pelos laços de casamento.

A união das famílias de mesma nacionalidade permitiu que os imigrantes juntassem recursos para mais tarde comprar suas próprias fazendas em sistema de consórcio e depois novas propriedades para cada uma das famílias. Muitos deles enriqueceram no início do Século 20 com as plantações de café, então o principal produto de exportação do Brasil, enviado ao exterior por meio do porto de Santos.

Nessa época, a cidade de São Paulo passou a brilhar com os casarões dos fazendeiros de café, que tornaram famosa a Avenida Paulista, onde se construíam casas com telhas importadas da França, mármore de Carrara e madeira de lei brasileira. Os primeiros italianos a se aventurar na indústria fizeram fortuna, como o Conde Francisco Matarazzo (1854-1937), que a partir da venda de barris de banha de porco construiu o maior império industrial do país (as Indústrias Reunidas Matarazzo). O nome Matarazzo, desde então, se tornou um símbolo de riqueza, especialmente em São Paulo.

No interior de São Paulo, os colonos italianos não encontraram uma vida fácil. Seu trabalho era desmatar o sertão, para permitir o plantio do café, uma cultura favorecida pelo clima e a célebre “terra roxa”. Esse nome é também uma influência italiana, pois terra roxa não existe. Trata-se de uma terra muito rica em nutrientes, de cor vermelha (ou “rossa”, em italiano).

No sertão paulista, além das dificuldades naturais do trabalho e de um país diverso de sua terra natal, os italianos enfrentavam o preconceito dos brasileiros, que os consideravam uma gente bronca, mal educada e temperamental. Em sua maior parte contadinos, como eram chamados na Itália os trabalhadores da terra, eles tinham pouca instrução, mas muita vontade de trabalho. E, aos poucos, começaram a se impôr e influenciar também a cultura do país com sua comida, sua língua e seus costumes.

Com a crise mundial de 1929, quando as exportações de café praticamente foram paralisadas, muitos italianos que possuíam fazendas ficaram com pesadas dívidas e voltaram à pobreza. Muitos deles migraram para o norte do Paraná, onde ainda havia terras virgens e baratas a serem exploradas. Outros deixaram o campo e migraram para São Paulo, instalando-se em bairros como o Brás, Móoca e Bela Vista, que tiveram uma forte influência da cultura italiana.


Eram os bairros das cantinas e das cadeiras na calçada, onde se jogava baralho e bingo aos domingos, e de festas como a da Nossa Senhora Achiropita, promovida pela igreja do mesmo nome, que existe ainda na rua Treze de Maio, na capital paulista, realizada uma vez por ano.
Hoje, a influência da migração italiana ainda está muito presente na vida cultural e econômica do Brasil. O consulado italiano em São Paulo estima que existam hoje cerca de 25 milhões de descendentes de italianos no Brasil, o que seria cerca de um sexto da nossa população.


Os italianos participaram ativamente do primeiro grande ciclo de crescimento do país, agrícola e exportador, na era do café. Fizeram parte também da primeira fase de industrialização do Brasil, no papel dos primeiros grandes empreendedores de origem popular, como o Conde Matarazzo, ou como formadores do operariado brasileiro.

Deixaram sua marca no urbanismo, não apenas nos casarões neo-clássicos da Avenida Paulista como nos bairros operários. Sua identidade ficou na religião, de predominância católica, assim como entre descendentes de portugueses e espanhóis, e na culinária. A influência italiana é forte sobretudo no gosto do brasileiro pelas massas.


Em São Paulo, a pizza foi incorporada como um prato “local”. No Rio Grande do Sul, a influência italiana na culinária pode ser vista também nos cafés coloniais, onde se pode desfrutar de uma mesa farta; nas galeterias, onde o frango é servido com polenta e uma massa fina, conhecida como “cabelo de anjo”; e no vinho, que por influência italiana, e com o auxílio de um clima mais favorável, passou a ser produzido na serra gaúcha.


Essa influência se estende até ao futebol, onde ainda há clubes cuja tradição se liga ao passado do imigrante italiano, como o Palmeiras, de São Paulo, antigo “Palestra Italia”, que mudou de nome por causa de Segunda Guerra Mundial, quando os italianos passaram a ser hostilizados por estarem ao lado dos alemães no conflito. E o Cruzeiro, em Belo Horizonte, cuja fundação também se liga à tradição da colônia italiana.


É possível dizer que, assim com a mão de obra escrava fez do Brasil um país racialmente miscinegado, com grande presença dos descendentes do negro e sob forte influência das culturas africanas, o país seria outro sem os imigrantes italianos. No Brasil, a Itália hoje se encontra em toda parte, o que ajuda a fazer do nosso país um pedaço do mundo onde a diversidade melhor encontrou uma forma de convivência pacífica: não uma fonte de discórdia, mas de enriquecimento da vida.