sexta-feira, 25 de abril de 2014

O príncipe das trevas



Raphael Montes, o escritor brasileiro mais quente do momento, já não é mais tão novinho. Quando lançou seu primeiro romance, Suicidas, finalista do Prêmio Benvirá de Literatura, e depois do Prêmio São Paulo e do Machado de Assis, ele tinha 20 anos. Agora, já formado em Direito, ele tem 23.

Seu segundo romance, Dias Perfeitos, recém publicado pela Companhia das Letras, já o levou ao programa do Jô Soares e ganhou as páginas da grande imprensa, de O Globo, no Rio de Janeiro, ao Estadão, em São Paulo. Todos se encantaram pelos elogios de Scott Turow, que Montes conheceu numa feira literária em São Paulo, e que leu seu primeiro romance diante da insistência de sua mulher, que o tinha lido antes. Não deveria ser preciso vir um escritor estrangeiro para dizer que um brasileiro é bom, e fazer os leitores nacionais prestarem atenção em alguém. Mas no Brasil xenófilo, e meio provinciano, o marketing funciona assim. Montes sabe bem.

Ele é um rapaz de sorte. Mora num apartamento em Copacabana, onde o pai, colecionador de cachaças, montou para ele um quarto recheado de livros policiais. Oportunista, já caiu no convívio de grandes escritores, como num jantar na Flip em Parati há alguns anos, em que eu o enfiei como convidado por simpatizar com sua figura ao mesmo tempo abusada e pueril. E é esperto e trabalhador. Vive em sintonia com o pessoal de sua geração, o que faz dele um escritor ligado no comportamento dos jovens de hoje, e sua literatura talvez tenha muito a ver com isso. Boa parte do fato de ter conseguido chegar a finais de prêmios literários vem de que ele não é, realmente, um escritor policial, como anuncia. Sua especialidade é descrever a frieza patológica de uma juventude que não conhece ou não sente o peso de certos valores, em histórias de terror psicológico nas quais o crime, na verdade, é o menos importante.

Menor que Suicidas em tamanho, menos ambicioso, mas mais fácil de ler, Dias Perfeitos conta a história de um estudante de medicina que sequestra uma garota na tentativa de fazê-la apaixonar-se por ele. Mistura elementos de filmes conhecidos, como uma colagem de O Colecionador (William Wyler, 1.965), Átame! (Pedro Almodovar, 1.990) e sobretudo A Bela da Tarde (Luis Buñuel, 1.967). Apesar de uma certa sensação de dèja vu, especialmente para quem viu os filmes, Montes consegue fazer uma história original, ambientada no Brasil, que deixa ao final a mesma estupefação das histórias do cinema que o precederam e, propositalmente ou não, lhe servem como referência.

Claro, Montes, que quando eu estava na Benvirá apelidei internamente de "Raphael Mortes", ou apenas Montinhos, ainda é muito jovem. Não é ainda o rei do terror psicológico, mas já tem status de príncipe. Consegue criar bem personagens, nuances psicológicos e o clima desejado. Ainda peca na ação, que às vezes parece despropositada, ou pouco verossímil. Mas ele está ficando mais velho, e apenas começando. Quem sabe atinja a maturidade literária em breve – no seu próximo romance, aos 25.

Um comentário:

  1. Excelente resenha. Coincidiu com uma referência que fiz sobre a semelhança com "O Colecionador", comentário que fiz ao Montes.

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